Literatura de Star Trek

A série original de TV Star Trek completa 50 anos esta noite. Muito já foi (e, com certeza, ainda será) escrito sobre o fenômeno de mídia que ajudou a pôr a ficção científica no mapa mais amplo da cultura popular: talvez apenas os quadrinhos e seriados cinematográficos de Buck Rogers e Flash Gordon tenham feito tanto, antes da estreia de Trek, para tornar os temas e tropos típicos do gênero familiares aos olhos das multidões.

De todo o material publicado, no entanto, a esmagadora maioria se concentra, de modo perfeitamente compreensível, na produção audiovisual: séries de TV, série cinematográfica, desenhos animados. Por isso, resolvi usar este espaço para chamar atenção para um cantinho normalmente negligenciado do universo de Star Trek: a literatura.

Aliás, vou circum-navegar todo o tedioso debate sobre se os chamados media tie-ins (livros de ficção "amarrados" a universos ficcionais nascidos em outras mídias) merecem ou não ser chamados de "literatura". Vou assumir que contos e romances sempre são obras literárias. Se um conto ou romance específico representa boa ou literatura, no entanto, é um juízo à parte, e que deve ser feito caso a caso: não acredito em vícios de origem.

No caso específico de Star Trek, a literatura "amarrada" à série -- contos e romances protagonizados por figuras como Kirk, Spock e McCoy, ambientados na galáxia da Federação Unida de Planetas -- tem vários pontos altos, e uma história bem interessante.

Autores consagrados dedicaram-se a produzir prosa sobre a série: os roteiros do seriado original, por exemplo, foram quase todos adaptados como contos por James Blish, uma das figuras mais brilhantes da ficção científica literária britânica (se não acredita, corra para ler a magnífica fc lógico-teológica A Case of Conscience ).

A coleção desses contos documenta algumas das interações mais intrigantes da cena da ficção científica de língua inglesa, já que muitos dos roteiros convertidos em contos por Blish tinham sido escritos originalmente por autores que eram, eles mesmos, contistas soberbos -- caso, por exemplo, de Robert Bloch, Theodore Sturgeon e Richard Matheson.

Foi Matheson, aliás (em seu roteiro para O Inimigo Interior), quem originou o conceito apropriado por Blish para seu romance original de Star Trek, Spock Must Die!  Quem assistiu ao episódio escrito por Matheson se lembra se que, nele, um probelma no teletransporte divide o Capitão Kirk em duas metades, uma boa e uma má. No romance de Blish, algo semelhante acontece com Spock -- e que vilão pode ser mais perigoso que uma versão absolutamente maligna e corrupta do impassível oficial de Ciências?

O romance de Blish é um dos pontos altos da série literária de Star Trek (que, graças ao Grande Pássaro da Galáxia, nunca deixou que bobagens como continuidade ficassem no caminho de uma boa história), mas não é o único. Dá para citar também World Without End, de Joe Haldeman, Efeito Entropia, de Vonda McIntyre, e outros.

De uns tempos para cá, a série literária meio que foi tomada por escritores profissionais de tie-in, gente que costuma pensar mais com cabeça de roteirista e centrada na mitologia interna da série. Isso tende a tornar a parte mais especulativa da ficção científica meio rala, mas em muitos casos a sensação de receber notícias de velhos amigos -- os personagens -- é recompensa suficiente.

Mas nem tudo são "velhos amigos". Há alguns anos, começaram a ser criadas séries de Star Trek exclusivas para o mercado literário, como as aventuras da nave espacial Excalibur, cuja tripulação só aparece em livros e HQs, ou as intrigas da estação espacial Vanguard. A série da Excalibur foi criada pelo veterano roteirista de HQ Peter David, e embora ele não seja um de meus autores favoritos (seu estilo é "malandro" ou "espertinho" demais para o meu gosto, se é que dá pra entender), tem muitos fãs.

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